sábado, 18 de agosto de 2012

Guiné-Bissau – Um país? Um território onde a violência e a impunidade são regras?


Com o decorrer desses calamitosos anos de independência, daquilo que se pretendia transformar numa república, é hoje lícito interrogar se a minha pátria pode, efectivamente, enquadrar-se na definição de um país, tendo em conta os conceitos de Território, Estado e Nação soberanos. Julgo que tornaria fastidioso elencar aqui todos os motivos desta lícita interrogação (estou no entanto aberto a discussões), mas gostaria de centrar essa observação na actualidade e nos últimos acontecimentos políticos.

Há quem aponte como causa da nossa desgraça a iliteracia do povo, mas preocupa-me mais a ambição desmedida, opiniões e posicionamentos dos guineenses letrados, que se colocam do lado do mal, tentando justificar alguns males como forma de pôr fim a outros males! E nunca saímos da senda dos males!!! Também como Luther King, preocupa-me o silêncio dos bons, do que o grito dos violentos, dos corruptos e desonestos. Preocupa-me sobremaneira, que todos os crimes de perseguição, assassinatos, violações, torturas e crimes económicos cometidos até hoje na Guiné-Bissau e os respectivos criminosos, continuem a gozar de uma monstruosa impunidade. Preocupa-me que esses actos criminosos, até hoje, serviram apenas para ganhar poder ou destruir (física e politicamente) os adversários políticos e para a defesa de interesses económicos pessoais e corporativos.

Preocupante também é ver letrados muito empenhados a tentar demonstrar o envolvimento e a responsabilidade política (e como mandante) do Primeiro-Ministro nos assassinatos, branqueando de forma completamente acéfala a responsabilidade material dos verdadeiros executantes desses crimes e, ainda, a responsabilidade hierárquica do CEMGFA, quando todos sabemos que a maioria desses crimes foi cometida pelas mãos dos criminosos camuflados de militares! Como podemos permitir que os verdadeiros criminosos continuem a circular armados nas ruas daquele território que se queria fazer um país, comandados pelo maior criminoso da actualidade guineense, enquanto divertimo-nos a gastar tempo, dinheiro e rios de tinta, a procura do responsável politico ou moral desses crimes!!! O processo não teria de se iniciar de forma contrária!? Não se devia apanhar primeiro o executante e pô-lo a confessar a autoria material e denunciar os seus mandantes!?

Preocupa-me sobremaneira que desapareça um cidadão, politico e figura pública, como Roberto Ferreira Cachéu, e o alarme ter sido dado só alguns meses depois! Preocupa-me que ainda hoje nada se sabe de concreto, do que aconteceu a este cidadão. Até então, só assistimos a versões não provadas, suposições, ataques e defesas levianas na praça pública, com o único propósito de fazer aproveitamentos políticos... O PAIGC, o Primeiro-Ministro Carlos Gomes Júnior, assim como os familiares do cidadão desaparecido, têm o dever de dizerem publicamente mais do que tem sido dito até então. Como cidadão guineense ficaria mais descansado se um deles viesse confirmar oficialmente e com provas, a morte desse cidadão, permitindo dessa forma a justiça trabalhar sobre um pressuposto concreto e não no pressuposto de desaparecimento, que implica muito mais matéria e área para investigar.

Continua a preocupar-me que um grupo de letrados guineenses tenham pactuado com um acto ilegal como um golpe de estado, forjando um governo denominado de transição, sem consciência das limitações e consequências que isso significa para o país, insistindo nos seus propósitos pessoais, partidários ou outros, sem se preocuparem com a sobrevivência e o bem-estar da população guineense… Para aqueles que continuam a condenar os firmes posicionamentos da CPLP, do governo português e da União Europeia, acusando-os de não terem reagido da mesma maneira, aquando do assassinato de Nino Vieira e Tagmé Na Waie, queria perguntar-lhes apenas, se querem eternizar a cultura de golpes de estado e assassinatos na Guiné-Bissau? Porque, se continuarmos a tolerar golpes de estado, assassinatos ou espancamentos, por qualquer motivo que seja, continuaremos a criar precedentes e justificações para futuros golpes de estado e outras violências, de forma cíclica e interminável. Quando é que acham que Portugal, CPLP ou a União Europeia teriam então moralidade para agir com tolerância zero a golpes de estado? Que moral terá amanhã a CEDEAO para condenar um outro golpe de estado, se apoiou e colaborou com este!?

A tolerância zero a golpes de estado, crimes de sangue e económicos, tem de ser uma realidade mundial e na Guiné-Bissau em particular. Esta é a oportunidade para o povo guineense escolher entre manter a tolerância zero ou condescender-se com os últimos golpistas criminosos e o governo fantoche por eles forjados. Não podemos deixar que o futuro da nossa terra seja decidido apenas pela CEDEAO, CPLP, ONU ou União Europeia. Temos o direito, o dever e a obrigação de dizer para onde queremos ir. Um povo que não se manifesta, é um povo facilmente dominado. Um povo que não se organiza para definir os seus padrões, não pode ter um estado, uma nação e um território soberanos…

Jorge Herbert